18.5.08

jerusalém

Como o pai que morre e deixa uma pequena herança - a parte ainda não desbaratada - também a primeira História não deixará muito à segunda, estou certo. No entanto, tenho um medo, um medo ainda maior do que o de perceber que o estado clínico da História piora de dia para dia ou de século para século, medo ainda maior do que chegar a resultados que mostrem que a intensidade da relação horror/tempo tem vindo a aumentar; se a grande esperança é a de que o horror, afinal, tenha diminuído numa progressão gradual e objectiva, de tal forma que se possa, por exemplo, provar que no ano 6000 o horror terminará por completo, desaparecerá da História, se essa é a grande esperança, o grande medo é, então, não o fim desta História - como a linha subitamente horizontal do electrocardiograma no homem que acabou de morrer - mas sim que o gráfico revele uma estabilidade, uma estabilidade assustadora, uma constância do horror no tempo, uma manutenção da normalidade do horror que termine por completo com qualquer esperança.

A curva visível nos três primeiros séculos depois de Cristo a repetir-se em cada três séculos; é desta repetição de curvas, é deste tédio que mais receio tenho. Se o horror estiver a diminuir é sinal de que seremos mais felizes daqui a cem gerações, se o horror estiver a aumentar esta História acabará, pois o horror final nada vai deixar; e depois, sim, poderá aparecer outra História melhor, mais ética. Estas duas hipóteses deixam-nos optimistas. Mas se o horror for constante, aí, então, não haverá esperança. Nenhuma. Tudo continuará igual.